quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Já ninguém chora de amor by Fernando Alvim

O amor mudou sem darmos conta disso. Já ninguém chora de amor como antigamente em que se alagavam estações inteiras de comboio, de autocarro, só porque ele ia embora, só porque ela o deixava por uma semana. Os bombeiros num corrupio, “É mais uma inundação aqui na estação de sta Apolónia, venham depressa que se trata de uma despedida para o ultramar”, os lenços a abanarem como se estivessem em Fátima a 13 de Maio, os bombeiros a correrem, as crianças a chorarem por verem a mãe num pranto, o pai a dizer para não o fazerem que ele volta muito em breve,já amanhã já amanhã, a mãe inconsolável, as crianças também, o pai que não consegue controlar-se, o chefe da estação que também se sensibliza . E então: Que é feito disto? Onde estão as pessoas que choram umas pelas outras?

Já ninguém corre atrás dos comboios em andamento, já ninguém tenta dizer uma última coisa antes da partida, já ninguém diz adeus de peito aberto. Sejamos claros, é preciso chorar mais. Mas mais importante do que isso, é preciso chorar bem. E a este nível, não tenhamos dúvidas que o melhor choro, é o que tem soluços e faz fungar. Eu sei do que falo. Eu já chorei de amor e lembro-me bem que soluçava e fungava com grande mestria. O melhor choro aqui vos digo, não separa o fungo do soluço - isso nunca - porque é precisamente essa perniciosa junção, que causa um tamanho desconforto a nível respiratório, que nos obriga a parar de o fazer e nos certifica - agora sim - que estamos perante um grande amor. Soluçante. Fungoso. Exactamente, como o amor deve ser.

Fernando Alvim - http://esperobemquenao.blogspot.com/

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